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A Neurologia atualmente: mudanças de uma pandemia e a contribuição do EEG explicadas pelo Dr. Daniel San Juan

29 de abril de 2022

NV: Doutor, se você já solicitou exames de eletroencefalograma domiciliares, poderia nos contar um pouco sobre sua experiência e quais as vantagens dos exames realizados em casa?

Dr. DSJ: Sim. É uma pergunta muito interessante porque avançamos muito no desenvolvimento tecnológico e na gestão da informação. Vejo que no futuro, o processamento de dados e a inteligência artificial serão ferramentas que veremos com cada vez mais frequência.  Recentemente, a Federação Internacional de Neurofisiologia divulgou diretrizes sobre os padrões mínimos necessários para realizar um eletroencefalograma ambulatorial. Fomos consultados através da Sociedade Americana de Neurofisiologia (EUA) para dar nossa opinião como especialistas. Eu, em particular, sou a favor de se realizar exames ambulatoriais, pelas vantagens que tem sobre os hospitalares. Talvez no futuro não seja mais necessário internar um paciente para fins de diagnóstico. Teríamos um cenário mais realista e em condições comuns aos pacientes, sem sacrificar a qualidade do registro. Estamos, inclusive, vendo que a capacidade de vídeo que pode ser instalada ambulatorialmente também é de muito boa qualidade. E que não existe algo, como “os exames são muito duvidosos”. Ou se os eventos podem ou não ser capturados.

Acredito que não existam apenas as razões financeiras ou econômicas, como também muitos benefícios para aqueles eventos que são pouco conhecidos e que demoram muito para serem definidos. Esses registros podem ser mais longos e um exame padrão pode não ser necessariamente aquele realizado em hospital com 20 minutos de artefatos, mas sim registrar o paciente em condições naturais. No futuro, se adicionarmos mais elementos, provavelmente também ajudará a prever quando um paciente pode ou não ter uma convulsão. Talvez não seja irracional pensar que futuramente, além de um eletroencefalograma diagnóstico, possamos ter mais sensores – os chamados sensores de roupa – para definir mudanças de frequência, ou se o paciente está mais suado, ou se é provável que esteja começando a apresentar anormalidades. Para que se possa antecipar um tratamento, intervenção ou uma ida a um hospital.

As vantagens de um estudo eletroencefalográfico ambulatorial são trabalhar com uma grande quantidade de dados e o aumento da capacidade diagnóstica. Não há limite de idade. Também oferecem a oportunidade de analisar mais variáveis ​​em condições cada vez mais naturais.

Isso estará disponível -espero- já no próximo ano, internacionalmente com a mais alta autoridade, para esses requisitos tecnológicos mínimos.

NV: E quais são os protocolos para esse tipo de exame?

Dr. DSJ: Protocolos são partes centrais. E um protocolo só pode ser feito com um número mínimo de eletrodos necessários. Ainda temos uma discrepância entre o que recomenda a Sociedade Americana de Neurofisiologia Clínica, que lista uma série de eletrodos, e a Federação Internacional, que diz que deve haver aproximadamente 21 eletrodos. Acredito que esteja entre 16 e 21. Ainda existe em desacordo sobre qual é o melhor, mas acho que esse é o primeiro passo a se dar. Principalmente em países da América Latina. É necessário que se aumente [o número de protocolos], que seja cada vez mais comum, que dados possam ser transmitidos e as informações compartilhadas. Isso ofereceria mais oportunidades.

Dependendo da idade, mais canais podem ser colocados, por exemplo, um canal de eletromiografia para ver se há um evento extra. No entanto, os mais importantes ainda são aqueles 16 a 21 da montagem padrão para eletroencefalografia. Ou seja, o que queremos fazer é trazer para um ambiente domiciliaro o que se faz em um hospital de maneira idêntica, sem abrir mão da qualidade. Por isso são padrões mínimos e não há um número máximo, porque se pode dizer: “bom, por que não colocamos mais? Quer dizer, se for em casa, não pode tolerar mais?”

Também depende das condições do paciente, porque também existem eletrodos que são denso. Afinal, acho que o que estamos procurando é que os requisitos mínimos sejam padronizados primeiro e que o vídeo seja incluído cada vez mais. Porque o vídeo também faz a diferença não só nas configurações dos eletrodos que são capturados, mas também no que está sendo visto.

Tem algumas particularidades de privacidade, pois imagine ter uma câmera de vídeo permanente e poder ver a dinâmica familiar? Como a família reage aos acontecimentos. Mesmo que seja um evento que não seja epiléptico, você também ter informações sobre o que pode ser feito, ou por que reagir, por que você tem essas dinâmicas. Talvez não seja necessário apenas para para o epileptologista avaliar o que ele sendo visto no vídeo, talvez isso também ajude ao psiquiatra, um psicólogo, a dizer: “bom, essas condições estão realmente além do que a neurologia pode oferecer de maneira tradicional.

NV: E todos os pacientes podem ter acesso a esse exames em casa?

Dr. DSJ: Isso tem muito mais a ver com a disponibilidade de recursos e serviços. Porque as máquinas atualmente são muito portáteis. Além disso, a preparação que um técnico faz – orientando a família e o paciente, indicando quais cuidados devem ter e as datas em que devem vir – não são nada complicados. São necessários apenas uma indicação e um protocolo.

Isso  tem mais a ver com a cultura do país, com a disponibilidade e também com o agente pagador. Devemos lembrar que são estudos mais longos. Enfim, se alguém disser: “a cultura de avanço tecnológico que a cardiologia tem, com implantes que podem ser colocados até debaixo da pele, e que te monitoram por meses e meses, por que não acompanhar uns dias de eletroencefalografia?!”

NV: Doutor, a dinâmica de pesquisa mudou atualmente devido à pandemia?

Dr. DSJ: Me Parece que sim. A pesquisa mudou, e mudou muito. Atualmente sou Coordenador Geral do Congresso Anual da nossa Academia Mexicana de Neurologia, onde se reúnem todos os neurologistas e neurologistas infantis do país. E o que tenho visto, com base nos últimos anos antes da pandemia e agora, é que há de fato um interesse claro no estudo das complicações, manifestações e tratamento da COVID no sistema nervoso, tanto central quanto periférico. Desbancou do topo completamente as doenças vasculares cerebrais e as doenças neurodegenerativas. Provavelmente porque estávamos todos concientes de que não tínhamos apenas a incerteza de como o vírus afetaria o sistema nervoso inicialmente, como também agora a onda de complicações que temos: neurológicas e psiquiátricas, para milhões e milhões de pacientes que foram expostos.

Incluindo aquilo que inicialmente pensávamos fazer parte dos critérios diagnósticos , como a anosmia, ou a incapacidade de sentir cheiro ou sabores. Há pacientes que não se recuperaram. Portanto, temos também o desafio de acompanhar e pensar nas intervenções que temos de fazer nesses pacientes. Porque os sentidos do olfato e paladar são importantes até para aspectos sexuais, está envolvido em tudo. Ou seja, não é só para comer bem, mas para as outras funções relacionadas a cheirar uma pessoa, uma flor… Os sentimentos têm a ver com isso. Então, sim, mudou drasticamente. Deslocou completamente e ocupa aproximadamente, segundo as estatísticas, 30% de todas as pesquisas relacionadas ao sistema nervoso.

NV: Como foi sua experiência cuidando de pacientes com COVID, especialmente pacientes diagnosticados com epilepsia?

Dr. DSJ: É uma pergunta muito pertinente para os tempos atuais. No início, havia muita incerteza sobre como o vírus SARS-Cov2 afetaria pacientes com epilepsia. Ou se os pacientes iriam desenvolver crises epilépticas pela primeira vez e, mais tarde, epilepsia. Estando na linha de frente do gerenciamento no hospital durante a pandemia, tive a oportunidade de atender pacientes com epilepsia. Porque acontece regularmente e há pacientes com epilepsia não controlada.

Contudo, felizmente, não vimos um aumento no número de internações, nem um descontrole maior do que o esperado para um paciente que já tenha diagnóstico. No entanto, também houve pacientes que vimos que desenvolveram crises epilépticas pela primeira vez.

Ainda há uma controvérsia sobre o quanto o vírus pode afetar o sistema nervoso central, principalmente os neurônios do cérebro, mas estudos eletroencefalográficos têm ajudado a tentar identificar esses pacientes. Independentemente da clínica ser um elemento importante na hora de diagnosticar um pacientes com epilepsia ou crises epilépticas, deve-se considerar que não é tão fácil nesse contexto. Porque os pacientes apresentam hipóxia, ou seja, a função pulmonar é um dos órgãos mais afetados. Por esse motivo, pacientes críticos não podem acessar facilmente os estudos de rotina, como geralmente acontece com pacientes que são avaliados pela primeira vez por crises epilépticas.

Em um contexto global vimos que o estresse, o isolamento e a falta de acesso aos medicamentos convencionais para o controle da epilepsia, são o que está levando ao descontrole das crises nos pacientes diagnosticados com epilepsia.

NV: Como foi a elaboração das guias de protocolo de segurança para a realização de exames neurofisiológicos?

Dr. DSJ: A elaboração dos guias foi uma iniciativa minha, como mexicano, porque estava observando que as ondas, como continuam a acontecer, tinham origem continental. Tivemos a oportunidade na América Latina de prever o que estava acontecendo na Europa naquela época, para a primeira onda. Estávamos esperando passivamente que a mesma coisa acontecesse aqui, como espectadores. Mas felizmente, junto a colegas da América Latina e especialmente ao Dr. Texeira no Brasil, que também é líder em neurofisiologia no continente, organizamos um grupo de especialistas para preparar essas guias em tempo recorde.

Tivemos o apoio incondicional da Federação Internacional de Neurofisiologia Clínica para desenvolvê-las. Com a visão de especialistas em cada uma das técnicas, não só eletroencefalografia, como também estudos do sono, polissonografias, estudos de neurocondução e ultrassonografia muscular. Todas as áreas deveriam ser protegidas, tanto pacientes quanto a equipe.

As vacinas ainda não existiam, então podemos dizer que trabalhamos internacionalmente na América Latina – o que não é comum conseguir tão rapidamente -, mas também transcontinental. O trabalho que fazíamos durante o dia era replicado na Europa no outro horário, ou seja, eram cobertas as 24 horas do dia. Isso possibilitou que as guias estivessem prontas em tempo recorde, na hora certa para que tivéssemos a oportunidade de conhecê-las e evitar óbitos, mesmo entre os profissionais de saúde. Infelizmente, o México não está muito bem posicionado em relação ao número de profissionais de saúde que morreram nesta pandemia, mas podemos dizer que, pelo menos na neurofisiologia clínica, não tenho conhecimento de ninguém que tenha falecido.

Acredito que a guia proteja não só aos pacientes, mas também aos que estão prestando o serviço. Decidir como medidas poderiam ser tomadas, tomando como base o que tínhamos na época e compartilhar com o mundo. Inicialmente – e isso é algo que não foi divulgado porque a publicação foi feita em inglês- partilhamos em nosso idioma [espanhol]. Por isso, paralelamente, apesar da Federação publicá-la em inglês para que o mundo a conheça, há uma outra versão que teve o apoio da Academia Mexicana de Neurologia.

Passamos de academia em academia, compartilhando principalmente com os que fazem parte do corpo técnico porque nem todos falam inglês, mas deveriam ler. Não era algo opcional, não era algo científico que ajudasse no diagnóstico, isso tinha o objetivo de nos proteger. E aí, com o conhecimento, começamos a ter conversas e cobranças, como não poder fazer um estudo porque a guia dizia que o paciente não pode hiperventilar. Mudamos a cultura de fazer um EEG padrão porque os pacientes não estão mais hiperventilados ou expostos à titulação de um dispositivo com respiração etc. Ou seja, há muito mais cuidado.

Portanto, há uma versão em espanhol que é única no México e na América Latina e a versão internacional, que faz parte das diretrizes que foram replicadas por canadenses e sociedades internacionais, como as de epilepsia, ou de sono, ou as que precisem.

NV: Como o exame de EEG é utilizado no desenvolvimento de uma pesquisa e quais indicadores dos testes de EEG são mais importantes?

Dr. DSJ: Esse é um elemento muito importante para avaliar se a resposta clínica ocorre de acordo com o que está sendo dado de terapia. Ou seja avaliar os efeitos esperados. O eletroencefalograma é uma ferramenta fundamental para ver a atividade anormal no cérebro, especialmente em pacientes com epilepsia. Nesse tipo de estudo, o que se faz é um registro prévio para fins diagnósticos a fim de determinar: onde está a área anormal, qual a frequência e se existem mais áreas para estimular.

Com isso, podemos trabalhar com um mapa de tensão e decidir: “bom, podemos estimular nesses pontos, para chegar nessa área”, ou seja, fazer um mapeamento personalizado. E esses mesmos elementos, que parecem anormais, podem ser comprovados com um EEG depois da terapia. Para ver se há uma redução na amplitude, na frequência, ou se há alguma alteração nas frequências da série.

O estudo pode nos dizer que sim, que um biomarcador pode diminuir de frequência e, portanto, também pode se traduzir em melhora clínica. Ou pode nos dar informações sobre a conectividade entre um eletrodo e outro e dizer que as frequências cerebrais mudam. E se eles mudam ao mesmo tempo estão dessincronizando. E se eles ficarem fora de sincronia, então não pode mais ser tão anormalmente desorganizado quanto na epilepsia.

NV: Como tem sido sua experiência trabalhando com os equipamentos Neurovirtuais?

Dr. DSJ: O equipamento de eletroencefalografia Neurovirtual, que tive a oportunidade não só tecnicamente -porque aprendi a montar e desmontar como uma criança- ,mas também como especialista interpretando a qualidade dos estudos, são extraordinários.

São dispositivos funcionais, flexíveis e fáceis de usar que permitem que sejam movidos praticamente para onde for necessário, sem nenhuma limitação no manuseio de dados. Equipamento que antes eram questionado, por se tratar de arquivos considerados especiais, pesados ​​e que ofereciam uma qualidade inadequada. A verdade é que é um equipamento que cumpre todos os requisitos internacionais – por assim dizer – mas também muitas preferências individuais. Nesse sentido, há flexibilidade. Além disso, permite o diagnóstico de doenças neurológicas nos melhores padrões, por isso é indicado para esses estudos.

É provável que, igual as outras empresas existentes, venha a ter cada vez mais avanços e funções, mas tal como está até agora, é um desenvolvimento que, do meu ponto de vista pessoal e científico, cumpre os mais elevados requisitos de qualidade e padrões.

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